sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Conto: Irmãos de João Armando Henrique Gonçalves

FACULDADES INTEGRADAS CAMPO-GRANDENSES
CURSO: LETRAS
PROFESSORA: NORMA MARIA J. DA SILVA
CONTOS AUTORAIS

  •  Título: IRMÃOS
  •      Autor:  JOÃO ARMANDO HENRIQUES GONÇALVES


            Andariam sempre juntos. Toda a sua vida anterior teria sido então um sonho que agora lhes parecia estranho e distante. No primeiro dia em que chegaram ao Instituto Philip Pinel, em Botafogo, ele a olhara e dissera:
            – Mamãe disse que vem nos ver assim que o pai mandar dinheiro, Ana.
             – Papai? Mandar dinheiro? Vai não. Nunca. Papai morreu a dez anos já, eu acho. André piorou, pensou Ana.
            No pátio do Instituto, já sob a luz morena e terrosa do crepúsculo, andavam seres, que para eles pareciam também de uma era distante. Um tempo remoto em que o mundo não era ainda habitado e só havia então o vasto desconhecido. André olhava detidamente para as sombras de um carvalho que se espraiava pelo pátio. As formas desiguais o remetiam ao mesmo quintal de sua infância onde pela primeira vez tivera contato com o que então seria para ele o mistério de toda uma vida.
            Ana sempre tivera uma força que vinha provavelmente de seu contato menos íntimo com a vida. Ela sempre soubera que viver era um risco grande demais e por isso tornara-se mais humana que André.
            Desde o momento em que os dois ultrapassaram um limiar e encontraram-se instalados no “hospital de loucos”, como disse Ana ao saber de seu destino, André tornara-se mais obscuro e pareceu tomar por conta própria a vertente do desconhecido. Ana perdera o contato com o irmão. Só havia agora um corpo amorfo que procurava algo escondido entre as sombras de um carvalho centenário.
            Já passadas as primeiras horas, André parara completamente de falar. Ana, que ainda possuía um elo com a vida humana, enxergava a transmutação do irmão como uma morte.
            Ela que sempre tivera horror à morte, que não concebia a ideia do nada absoluto, pensou então que a derradeira hora havia chegado. Sempre vivera através do irmão. Era ele que possibilitava a sua entrada no mistério sem o risco de se perder. No entanto, agora ela estaria para sempre fadada a permanecer na vida completamente humanizada.
            No início da madrugada, já tivera o cuidado de examinar bem a disposição arquitetônica do hospital. Ana encontrou uma única janela onde seria possível passar e pular próximo a calçada sem muito se machucar e empreendeu a fuga com André pelo já adormecido bairro de Botafogo.
             Sem um itinerário prévio, como fora durante toda a sua vida, foram para a praia de Botafogo e sentaram-se na areia. André olhou para Ana e repetiu maquinalmente o que dissera ao chegar ao hospício. A fuga para ele seria apenas uma mudança geográfica sem substância alguma. Ele se entregava totalmente ao mistério, ela pensou.
            Ficaram sentados juntos até a chegada da aurora e depois foram caminhando de volta para o Instituto. Ele mencionou novamente o que dissera na sua chegada e Ana então iniciou a sua partida para o desconhecido.

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